Queenstown Hill Summit, Nova Zelândia | Picture from my friend @mayaadriapopovich
Escrevo-vos da Nova Zelândia. O país que escolhi para permanecer neste tempo sem precedentes. O país que, de todos os lugares do planeta, me sinto mais segura política e socialmente.
Escrevo-vos da minha casa, em Wellington. Aqui estou recolhida há 11 dias. O comércio, restauração e retalho fecharam. As ruas estão desertas. Um silêncio ecoa por entre os prédios de uma cidade que outrora era vibrante e energética.
Os dias têm passado devagar, como se os relógios do mundo decidissem que estava na hora de abrandar a contagem do tempo. Donos de si, esta grandeza quer transgredir a barreira da Ciência e mostrar ficcionismo num mundo que já quer acreditar em tudo. Encontrar esperança numa quimera. Desespero.
Já dei por mim a olhar para o vazio durante horas. Já dei por mim com bichos carpinteiros a não parar um segundo, porque o tempo custa mais a passar se ficar parada, dizem. E comprovo.
Permaneço crente neste pedaço de terra no Pacífico. Crente de que daqui a uns meses o mundo entrará num processo de cura. Crente de que a proliferação de dor já passara, pertencendo à história, do mundo e de cada um de nós.
Uns dias abraço o meu coração e digo para ele: és a minha casa. E digo para mim: encontra mais conforto e amor dentro de ti neste ensejo delicado. E digo para o mundo: não me deixes aqui sozinha.
Outros dias sorrio para o sol, que entra envergonhado e sem pedir licença pelas janelas da sala. Agradeço ter uma casa, ter uma vida, ter apoio de um governo que não é meu, mas que cuida de mim.
Os sinos não tocam nas igrejas. O assobio do vento característico de Wellington abrandou. A nossa vida foi colocada em pausa. Uma intermitência entre vida e morte figurada que nos leva a beliscar a realidade, o físico. Uma intermitência que nos permitiu tomar tempo a uma vida non stop. Ora que bom. Uma intermitência que nos roubou liberdade. Ora que atrevimento.
Sou obrigada a viver o presente. Eu, que nas minha meditações me quero transportar para o momento presente, agora não há como escapar. Num status de vida incerto, não faço planos para lá do amanhã. Não sei quando voltarei a abraçar o sangue do meu sangue. Colocamos em pausa a sede de futuro. Não vislumbramos qualquer oásis. Nem miragem. Nem algo que se pareça.
Descanso-me acreditando que vai ficar tudo bem. [A crença, sempre a crença.] A esperança é o nosso fado. Corre nas veias portuguesas desde tenra idade. Afortunados por termos esperança e vida em nós desde os tempos áureos do nosso cordão umbilical.
Fecha os olhos, sente e agradece teres tempo.
Fecha os olhos, sente e agradece teres uma casa.
Fecha os olhos, sente e agradece teres corpo, mente e alma saudáveis.
Fecha os olhos, sente e agradece. Simplesmente agradece a sorte que tens.
Voltamos a encontrar-nos em breve.
Obrigada.